terça-feira, 17 de agosto de 2010

Azar Nafisi bombardeia os aiatolás na Flip


Um dos principais destaques da programação da oitava edição da Flip foi a participação da autora Azar Nafisi. A iraniana participou da mesa “Promessas de um velho mundo”, ao lado do escritor israelense A. B. Yehoshua e do mediador Moacyr Scliar.

Quando questionada pelo mediador se sua literatura era política, Azar disparou. “É uma literatura existencial. Nos Estados Unidos, principalmente, há uma doença, tudo é trazido para o ambiente político. Eu defendo que a idéia floresce independente da política. A principal função da literatura é transmitir a verdade, de modo a olhar mais criticamente para o mundo. Acho que a literatura sempre esteve para subverter a política, então, acredito que minha literatura seja subversiva”.

Azar Nafisi, autora de Lendo Lolita em Teerã (livro traduzido para 32 idiomas que ficou por 117 semanas na lista de best-sellers do The New York Times e rendeu a autora os prêmios de Livro do Ano de Não Ficção do Booksense, em 2004, e o Frederic W. Ness), não economizou nas críticas sobre a visão do mundo em relação ao seu país e criticou a postura do presidente Lula em alguns pontos.

“O presidente Lula disse há algum tempo que é amigo de Ahmadinejad. Como você pode ser amigo de uma pessoa que condena mulheres a morte por apedrejamento? O Brasil sequer tem pena de morte. Seria como se ele fosse contra ao que tem de melhor por aqui”, indagou a escritora sendo aplaudida calorosamente pela platéia.

Para a escritora best-seller, que foi exilada do Irã em 1981 sendo expulsa do país por se recusar a usar véu na Universidade de Teerã (onde lecionava literatura), o presidente do Brasil está equivocado em pensar que pode ajudar o povo iraniano. "Eu queria dizer que o presidente Lula disse em um primeiro momento que ele não queria intervir nesse assunto. Mas gostaria de dizer que ao não intervir, ele já está interferindo”, afirmou.

Quando questionada sobre o caso da iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, recentemente condenada à morte por apedrejamento sob a acusação de adultério, Azar Nafisi criticou o presidente do Brasil por sugerir asilo humanitário. “Oitenta por cento do povo iraniano está incomodado com o presidente Mahmoud Ahmadinejad. Então, todos os iranianos perseguidos deveriam vir para o Brasil, os jornalistas presos, as mulheres que se recusam a usar véu, não apenas essa mulher. Mas ele (Lula) não precisa trazer todos, é só trazer o Ahmadinejad e tudo se resolve”, ironizou, arrancando mais aplausos da platéia.

O escritor Abraham Yehoshua, concordou com as colocações e postulou que o Ocidente tem uma visão distorcida dos países do Oriente Médio. "Deveriam trazer o presidente do Irã para o Brasil e deixá-lo na Amazônia", brincou com a platéia. "Quando se fala em Irã, as pessoas imaginam o terrorismo e um presidente autoritário, o que é uma visão de mundo reduzida. O Irã é um país com mais de três mil anos de existência, que fez uma revolução importante e foi a primeira nação do continente a ter uma Constituição. Um país onde as mulheres já governaram ministérios", enfatizou.

Abraham Yehoshua também expôs a sua visão sobre a tensão entre o seu país (Israel) e o mundo islâmico. "Não dá pra comparar o meu caso com o dela (Azar). Vivemos em Israel, num estado livre. Há meios de comunicação para você expor sua opinião. Ter um vizinho (Irã) te vigiando é perturbador. Não sei o que o Irã quer com Israel. Não temos fronteira em comum. O Irã fantasia sobre nós e nega o holocausto, isso é um absurdo. É um país com o qual já tivemos relação diplomática por quase trinta anos. Espero que essa tensão se resolva sem guerra. Gostaríamos que os Estados Unidos, a Europa e o Brasil nos ajudassem a chegar a uma solução lógica", apelou.



No final, o mediador Moacyr Scliar pediu que a escritora iraniana projetasse o futuro de sua nação. “Detesto fazer profecias. Não sou otimista, sou esperançosa. Devido a história iraniana e a nossa luta de mais de cento e cinquenta anos por democracia. Apenas posso dizer que o Irã de hoje é o Leste Europeu de ontem", completou.

Hoje, Azar Nafisi é professora visitante de estética, cultura e literatura do Foreign Policy Institute, da Universidade norte-americana de Johns Hopkins. Em seu livro mais recente, O que eu não contei, lançado este ano no Brasil, a autora investiga as ligações entre o passado de sua família e a conturbada história do Irã.


Por Mário Barroso
MAC/BRASIL




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