quinta-feira, 24 de junho de 2010

Um imortal na biblioteca!

Nesta quinta-feira (24/06) o escritor Moacyr Scliar esteve presente em São Roque/SP e concedeu uma entrevista exclusiva para a MAC/BRASIL

Ele chegou com a sutileza de sempre e concluiu com a genialidade habitual, assim foi a participação de Moacyr Scliar na edição do programa “Viagem Literária”, da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, realizada na Biblioteca Pública Municipal Prof.º Arthur Riedel, em São Roque/SP.

“Estou aqui como um peixe dentro d’água. Não há lugar melhor para coversarmos”, disse ao iniciar o bate-papo com as mais de 280 pessoas presentes no evento, entre jovens e adultos.

Moacyr Scliar nasceu em Porto Alegre e percorreu uma longa viagem para chegar aos mais de setenta livros publicados, entre crônicas, contos, ensaios, romances e literatura infanto-juvenil. Suas obras ganharam adaptações no cinema, no teatro e seu estilo leve e irônico lhe garantiu um imenso público de leitores. Em 2003 foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras, tendo recebido antes inúmeros prêmios literários, como o Prêmio Jabuti (1988,1993 e 2009).

“No fundo eu continuo aquele gurizinho gaúcho que escrevia no papel de pão”, comenta remetendo-se a origem pobre de sua família imigrante. “Como não tinha dinheiro pra comprar um caderno eu escrevia ali mesmo e a primeira história que eu escrevi foi minha autobiografia. Terminei rápido, pois tinha apenas sete anos e não tinha muito o que contar”, ironiza, mostrando aos jovens que desde muito pequeno já tinha o hábito de escrever.

Sua família, de origem judaica, veio da Rússia fugindo da guerra e da perseguição. “Meus pais vieram num porão de navio, empilhados, sem ter o que comer”.

Segundo Moacyr Scliar, o desejo de ser escritor veio da admiração por seu pai, José Scliar. “Meu pai era um grande narrador, tinha prazer em contar histórias e eu dizia: quando crescer quero ser igual a ele. Mas o curioso é que ele não gostava de ler, não tinha esse hábito”.

No entanto, Sara Scliar, mãe do escritor e professora, era apaixonada pela leitura e deu nome ao filho em homenagem a obra Iracema de José de Alencar (no livro, o personagem Moacir simboliza o primeiro brasileiro nascido da miscigenação índio x português).

Depois de contar um pouco da sua história, Moacyr Scliar respondeu algumas perguntas dos jovens presentes. Quando questionado sobre a época da última ditadura militar no Brasil disparou: “Eu vivi a ditadura militar com muita intensidade. Na verdade, o golpe de sessenta e quatro teve um antecedente três anos antes. Quando Jânio renunciou, um gaúcho iria assumir o poder ( João Goulart) e houve uma tentativa de golpe. No levante contra o golpe, eu estava lá nas ruas com os estudantes. Eu me formei em medicina em sessenta e dois e nessa época eu era militante estudantil. Então posso dizer para vocês que a melhor ditadura é pior do que a pior democracia”, afirmou apontando que mesmo com os problemas recorrentes de corrupção no Brasil é muito melhor vivermos em um regime democrático.

Após responder as perguntas dos presentes, Moacyr Scliar deu uma entrevista exclusiva à MAC/BRASIL.


MAC/BRASIL: Moacyr, você tem algumas opiniões ditas de esquerda, já foi articulista de veículos como a Carta Maior (importante veículo de esquerda do Brasil), você é socialista?

Moacyr Scliar: “Sou socialista, mudei muito desde que eu era um jovem esquerdista, mas continuo acreditando nos valores básicos do socialismo: a solidariedade, a justiça social, o respeito a liberdade e acho que isso tem que ser complementado com uma tolerância em relação as opiniões dos outros, de admitir que nem todas as pessoas pensam igual e sobretudo de prestigiar a democracia como o regime pelo qual as mudanças sociais podem ocorrer.

MAC/BRASIL: Essa posição político-filosófica tem alguma relação com a sua origem familiar, social, enfim?

Moacyr Scliar: “Certamente. É algo até de família, porque na minha família muitas pessoas eram de esquerda e eu me criei lendo livros de esquerda, assistindo palestras, vendo revistas...”.

MAC/BRASIL: Qual a sua obra predileta relacionada ao socialismo?

Moacyr Scliar: “O Manifesto Comunista (de Karl Marx). Acho que é um belo livro. Como diagnóstico da injustiça social ainda é imbatível, as propostas de soluções é que são discutíveis, mas o diagnóstico é perfeito”.

MAC/BRASIL: Você acredita que a Sociedade Brasileira está indo em direção ao Socialismo, à Justiça Social, ou ao modelo Neoliberal arcaico norte-americano? Muitos perguntam como anda a cabeça do jovem brasileiro, então eu te pergunto, como anda a cabeça desses velhos do poder?

Moacyr Scliar: “Neste momento o Brasil está saindo de uma fase de deslumbramento com o neoliberalismo e eu acredito que vai chegar a um equilíbrio, não só o Brasil mas todo o mundo. Afinal, o mercado não pode ser o regulador da vida das pessoas. É preciso que se tenha bom senso para caminhar em outra direção”.

MAC/BRASIL: Você tem esperança em ver a questão do sionismo e do anti-semitismo resolvidas ainda neste século?

Moacyr Scliar: “Eu acho que os judeus pagaram um preço muito alto nessa história e a luta vale para todos, não só para o povo judeu. O holocausto não é um problema judaico, é um problema da humanidade”.

MAC/BRASIL: Esta semana morreu o escritor José Samarago, o que você pensa a respeito da obra deste que é considerado um dos principais escritores da atualidade?

Moacyr Scliar: “O Saramago é autor de obras importantes, mas defendia algumas idéias estranhas. Ultimamente ele dizia que a Espanha deveria anexar Portugal. Às vezes ele dizia algumas coisas absurdas, até com muita convicção. Mas ainda bem que suas opiniões não tinham muito a ver com sua literatura, que era brilhante”.


Por Mário Barroso
MAC/BRASIL

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